A mineradora australiana Fortescue tem um dos maiores e mais adiantados projetos para a produção de hidrogênio verde no Brasil. A planta será instalada no Porto de Pecém, no Ceará, onde deve ocupar uma área de 100 hectares e receber um total de US$ 5 bilhões (quase R$ 25 bilhões) de investimentos em duas fases.

A intenção da empresa é começar a produzir em 2027, e o projeto já recebeu licença ambiental prévia. Mas, segundo o executivo que comanda a Fortescue no País, Luis Viga, a usina não sairá do papel se não houver uma redução do preço da energia.

Na planta prevista pela Fortescue, a energia será responsável por 70% dos custos de produção. Tarifas de energia mais baratas, portanto, são essenciais para dar competitividade ao projeto, de acordo com Viga. “Até agora, estamos trabalhando com pré-contratos condicionados à decisão final de investimento, porque precisamos de um desconto considerável na energia e nos encargos para tornar o projeto viável”, diz o executivo, que defende um preço de energia 50% inferior (incluindo impostos) ao atual para que o projeto se concretize.

O preço da energia pode ser um entrave para o desenvolvimento do setor. A consultoria Thymos, especializada em energia, calcula que, em todo o mundo, ele tenha de cair 50% para tornar o hidrogênio verde capaz de competir com o gás natural, ou seja, para que o quilo do hidrogênio tenha um valor de venda de US$ 2, equivalente a R$ 10.

O hidrogênio verde tem alta capacidade energética: um quilo tem energia correspondente a quase três quilos de gasolina. Atualmente, o custo de produção do hidrogênio verde é de US$ 6 (R$ 30,40) por quilo. Um estudo da McKinsey aponta que o Brasil pode chegar a uma produção de hidrogênio com valor abaixo de US$ 1,50 (R$ 6,10) por quilo em 2030, o que tornaria o combustível bastante competitivo no cenário global.

O executivo Peter Terwiesch, da ABB (multinacional suíça que fornece tecnologia de eletrificação que pode ser usada na produção de hidrogênio verde), destaca que, dado o custo da energia para a produção do hidrogênio verde, a regulamentação do setor será chave para alavancá-lo.

Outro empecilho para a indústria do hidrogênio verde avançar é o valor dos equipamentos que fazem a eletrólise. De acordo com a Thymos, eles teriam de diminuir em 75% para o hidrogênio ter competitividade. Como é improvável que reduções desse patamar se concretizem, o mercado deve acabar pagando um “prêmio” pelo hidrogênio verde, por se tratar de um combustível limpo.

A criação desse mercado depende, em grande parte, da taxação da emissão de carbono – a criação de um “imposto verde” pode taxar atividades poluentes e produtos com base na quantidade de carbono emitido em sua produção. Se as empresas forem obrigadas a “pagar para poluir”, elas terão de buscar alternativas sustentáveis. Uma das opções poderá ser a compra do hidrogênio verde para reduzir a emissão de gases.

ALTERNATIVAS. O CEO da ThyssenKrupp na América do Sul, Paulo Alvarenga, defende a concessão de uma isenção na taxa de transmissão de energia para tornar os projetos de hidrogênio viáveis financeiramente. Segundo ele, essa isenção seria dada apenas para as primeiras usinas, enquanto o setor ainda engatinha. A ThyssenKrupp é uma das empresas que têm a tecnologia do eletrolisador, o equipamento que separa as moléculas da água para a produção do hidrogênio verde. A energia corresponde a 70% do custo de produção do hidrogênio.

Há diferentes projetos de lei que tratam da regulamentação do hidrogênio verde em tramitação no Congresso. Dois deles, um aprovado na Câmara e outro no Senado, trazem diferentes incentivos para o setor. A proposta gerada no Senado, por exemplo, cria incentivos para a tarifa de energia. Senadores e deputados articulam agora a fusão das propostas em um só texto para tentar criar um marco legal do setor.

A diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciana da Costa, tem defendido que o governo lance mão de subsídios pontuais para incentivar alguns setores da transição climática, como o desenvolvimento do hidrogênio verde no Brasil. “O Fundo Clima é onde vamos ter capital com custo diferenciado. O BNDES pode ajudar com linhas mais longas do que o mercado. Mas não vejo os projetos de hidrogênio verde antes de 2026 e 2027”, diz.

Uma segunda opção, para Alvarenga, seria a adoção de um mandato como o que obriga a mistura de etanol à gasolina. No caso do hidrogênio, poderia ser obrigatória a mescla na amônia (um gás incolor) ou no gás natural. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
Published On: 11 de abril de 2024

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