Quando pensamos em países produtores ou exportadores de petróleo, vêm-nos à mente os países do Golfo Pérsico. Ou então a Venezuela. Ou o Irã e o Iraque. E a vilipendiação destes países é imediata.

São associados a regimes absolutistas, conflitos sociais e insustentabilidade ecológica. Na guerra do nós contra eles, sabemos em que lado bate o sol.

Mas um dos maiores produtores e exportadores de petróleo e gás do mundo é a Noruega, o mauricinho da Europa. O país nórdico produz mais petróleo do que a Venezuela, Qatar ou Angola, e é, de longe, o maior exportador europeu de gás. Se a Noruega tem um dos PIB per capita mais altos do mundo, deve-o integralmente aos combustíveis fósseis.

No centro da estratégia está a Equinor, empresa de energia fundada na década de 1970 que opera em mais de 30 países, incluindo o Brasil. Em 2023, a produção de petróleo e gás aumentou em 1,5% face a 2022.

Em março de 2023, a empresa fez outra descoberta de petróleo e gás perto do campo Troll no Mar do Norte (produção estimada de 84 milhões de barris) e, alguns meses mais tarde, foi aprovado um projeto da Equinor para explorar o campo de Rosebank, a maior reserva inexplorada de combustíveis fósseis no Mar do Norte britânico.

Este mês a empresa norueguesa começará a perfurar os primeiros poços exploratórios em águas profundas no offshore argentino, localizados a 300 km da cidade de Mar del Plata.

Esta semana a Noruega tornou-se também no primeiro país a aprovar a prática controversa de exploração mineira no fundo do mar. Vários cientistas temem que este tipo de atividade venha a devastar a vida marinha.

Apesar do seu traquejo em combustíveis fósseis, é um dos países com melhores índices do mundo em sustentabilidade (Yale Environmental Performance Index), em reputação (World’s Most Reputable Countries) e soft power (Global Soft Power Index). Muito acima do Brasil nestes rankings.

Tem também uma das metas mais ambiciosas de descarbonização (2030) e o maior índice de utilização de carros elétricos.

Tem mais. É uma das nações com maior capacidade para exportar líderes globais. Borge Brende (ex-chanceler) comanda o Fórum Econômico Mundial, que organiza Davos, com início marcado para a próxima semana.

Jens Stoltenberg (ex-premiê) é o secretário-geral da Otan. Uma das figuras mais icônicas na história da ONU é Gro Harlem Brundtland (ex-premiê), autora de um relatório histórico sobre desenvolvimento sustentável.

A presença internacional da Noruega e a contribuição dos seus políticos não é rechaçada pelo fato do país ser uma economia dependente do petróleo.

O fundo soberano da Noruega, de US$ 1,5 trilhão, o maior do mundo, é alimentado pelos recursos do petróleo.

Investe em mais de 9.000 empresas em 70 países, incluindo no Brasil, com participações em quase uma centena —bancos, companhias aéreas, varejo, transporte e saneamento. O fundo é muito reconhecido no mercado de capitais e as suas origens carbônicas não motivam críticas.

Em várias declarações públicas, o primeiro-ministro Jonas Gahr Store tem explicado como é que o país consegue ser ao mesmo tempo uma potência petrolífera e ambiental.

Reforça que a transição é uma jornada, que não há problema em continuar a investir em petróleo desde que os investimentos em renováveis sejam superiores, e que a transição energética tem de ser estimulada pelo lado da demanda e não por cortes na oferta.

Enquanto a Noruega tem uma visão equilibrada sobre a transição energética, a mensagem do Brasil tornou-se ideológica e bipolar.

O anúncio recente de investimento em uma biorrefinaria em Mataripe na Bahia para que o Brasil se torne um dos maiores exportadores mundiais de Combustível Sustentável de Aviação recebe uma atenção muito menor do que os esforços da Petrobras para explorar petróleo na bacia amazônica.

A falta de consistência na mensagem interna e externa do país empurraram-no para um confronto de interpretações.

A articulação do governo é limitada e eventos internacionais, como a COP28, são um poleiro para vários cocoricares.

Enquanto o Brasil se apresentar de forma ufanista como uma potência global ecológica fazendo de conta que não é o sétimo maior produtor mundial de petróleo ou enquanto a Petrobras não se associar às metas de descarbonização do país, o Brasil continuará a ser um alvo fácil para aqueles que mineram incongruências.

A posição ambiental de Bolsonaro era execrável, mas clara. A de Lula é admirável, mas inconsistente.

A oportunidade para afinar a mensagem está no Fórum Econômico Mundial de 2024, em Davos.

No dia 16 de janeiro, às 8h15 (horário local), o presidente da Petrobras Jean Paul Prates participará no painel “Energy amid Rivalry”, enquanto às 13h Marina Silva liderará o painel “Brazil’s Sustainable Transformation”.

Que mensagem emitirão? Teria sido um feito do governo brasileiro se ambos participassem no mesmo painel.

(Coluna – Rodrigo Tavares)

Autor/Veículo: Folha de São Paulo

Published On: 11 de janeiro de 2024

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