10/05/2022
O reajuste médio de 8,87% anunciado ontem pela Petrobras nos preços do diesel e que passa a valer a partir de hoje nas refinarias da empresa recupera parcialmente a defasagem do produto no mercado doméstico em relação às cotações internacionais. Uma vez endereçado o problema do diesel, que sem reajuste poderia acentuar o risco de desabastecimento nos próximos meses, as atenções se voltam para a gasolina. Importadores e alguns bancos calculam que a defasagem na gasolina supera os 20% e que, portanto, um aumento seria justificado. Mas fontes próximas da Petrobras discordam dos cálculos e afirmam que os preços da estatal têm se mantido próximos à paridade, com variações pontuais abaixo e acima do mercado externo. Dessa forma, dizem, não há perspectivas para reajustes da gasolina a curtíssimo prazo.
Ontem, após quase 60 dias sem reajuste, a estatal comunicou que aumentaria o preço médio do litro do diesel às distribuidoras de R$ 4,51 para R$ 4,91. No ano, o diesel acumula alta de 47,01% nas refinarias, segundo o Valor Data. O mais recente reajuste foi antecipado pelo Valor. A Petrobras também informou ontem que vai manter o preço médio da gasolina, que está em média em R$ 3,86 o litro nas refinarias há dois meses. O último reajuste dos dois combustíveis ocorreu em 11 de março, quando houve aumento médio de 18,7% na gasolina e de 24,9% no diesel.
A consultoria StoneX estima defasagem de 8% na gasolina em relação preço de paridade internacional (PPI). Os importadores reunidos na Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) falam em 22%, com necessidade de aumento de R$ 1,09 em média no litro da gasolina para zerar a defasagem com o mercado internacional. Já a XP calcula que para equiparar os preços internos aos externos seria preciso um aumento de 20,7% na gasolina. Fonte ligada à estatal retrucou: “[a gasolina] Não está fora da paridade. Com a queda do petróleo, [o produto] está na paridade”.
A Petrobras disse, em nota, que cada derivado de petróleo possui mercado e dinâmica próprias. “Isso faz com que os preços de cada produto variem de forma independente em função de seus balanços globais de oferta e demanda.” Acrescentou que decisões de preços são baseadas em análises técnicas e independentes levando em conta os cenários externo e interno. “E, neste momento, foi identificada a necessidade de reajuste apenas nos preços do diesel.” Reforçou que os preços de venda da empresa buscam o equilíbrio com o mercado internacional evitando o repasse imediato da volatilidade externa e da taxa de câmbio causadas por eventos conjunturais.
Fontes do setor dizem que as defasagens nos preços dos combustíveis causam problemas pontuais no abastecimento de algumas distribuidoras a postos, com “falta seletiva” de produtos, sobretudo nos postos de bandeira branca, aqueles que não têm contratos de exclusividade de suprimento com uma distribuidora. Depois do reajuste no diesel, a partir de hoje, a Abicom calcula que o produto ainda teria uma defasagem de 6% em relação ao PPI. A StoneX fala em 12%.
Luiz Carvalho, analista de petróleo e gás do UBS BB, disse que o reajuste no diesel mostra a independência da Petrobras e também a preocupação da empresa com o abastecimento do mercado doméstico. Classificou como “sensata” a decisão da petroleira de não repassar toda a defasagem de uma vez só. As estimativas são de que a diferença no diesel, na sexta, estava em 20%. Como o petróleo caiu, Carvalho calcula que, na prática, a defasagem na gasolina e no diesel é menor do que a indicada por Abicom e Stonex. O barril do petróleo tipo Brent, principal referência internacional, negociado para entrega em julho, encerrou ontem a US$ 105,94, queda de 5,74%.
Há outra variável a ser considerada que é o fato de o diesel ter se “descolado” do preço do petróleo nas últimas semanas, mantendo viés de alta. O consultor em gerenciamento de risco da StoneX, Pedro Shinzato, disse que há uma dificuldade maior de importar diesel do que gasolina: “Vivemos um momento atípico para o diesel, que foi o combustível líquido mais impactado pela guerra na Ucrânia. O mercado de gasolina não está tão caótico quanto o do diesel.”
Shinzato afirmou que o mercado nacional se adaptou a trabalhar com uma diferença de preços entre o combustível importado e o que é refinado pela Petrobras. As distribuidoras trabalham aplicando ao consumidor final preços médios entre o produto nacional e o importado, disse. E acrescentou: “As regiões que dependem mais de produtos importados têm a tendência de ter preços acima da média do praticado pela Petrobras, casos de Norte e Nordeste. Nas regiões em que a Petrobras tem mais refinarias, como Sudeste, Centro-Oeste e Sul, a tendência é de preços mais próximos aos praticados pela empresa, que estão abaixo do mercado internacional.” No mercado doméstico, o risco de problemas no suprimento na gasolina é menor pois o produto pode ser substituto pelo etanol, afirmou Sérgio Araújo, presidente da Abicom. Após o reajuste do diesel, os importadores independentes ainda têm dificuldades para importar dada a defasagem que persiste, disse Araújo.
Felipe Perez, da S&P Global, disse que o reajuste no diesel resolve “temporariamente” a situação. “O Brasil tem que ficar de olho em como os EUA se comportam com as sanções plenas da Europa à Rússia. Pode ser que os EUA priorizem a Europa no fornecimento de diesel.” Se a Europa cortar de vez a entrada de petróleo e combustíveis russos, pode ser que o sinal de preço europeu faça o diesel ou a gasolina dos EUA irem para o mercado da Europa, disse. As refinarias americanas da costa do Golfo, onde fica o maior complexo de refino nos EUA, estão próximas do máximo de utilização. A América Latina, nesse cenário, pode ser alimentada de diesel pela Índia ou China. Perez disse ser esperado não haver reajuste na gasolina agora uma vez que o produto vem perdendo participação em regiões para o etanol.
“Se a economia brasileira estivesse pujante, a situação seria mais crítica. Dois fatores que podem fazer ‘o copo transbordar’ seriam o aumento do consumo do diesel no hemisfério Norte com a chegada do verão, que tornaria mais difícil a importação, e a economia brasileira decolar, o que levaria a maior consumo de diesel”, disse um executivo. Ilan Arbetman, da Ativa, disse que há potencial para aumento da gasolina às distribuidoras: “Esse tema [o reajuste de combustíveis] está efervescente no cenário político nacional”, afirmou.