Lá se vão dois anos desde a primeira grande onda de abertura do setor de gás natural, no começo de 2022, quando uma série de novos fornecedores de molécula fincaram os pés no mercado brasileiro – deslocando parte da concentração da Petrobras.

Falta oferta de gás novo, privado, para uma nova onda de desconcentração do setor. A maior expectativa, nesse sentido, está debruçada sobre o projeto Raia, operado pela Equinor em sociedade com a Petrobras e Repsol Sinopec – e que injetará no mercado cerca de 14 milhões de m3/dia a partir de 2028.

Não quer dizer, porém, que a abertura do mercado tenha parado por completo. A assinatura de novos contratos de suprimento e a chegada de mais gás natural liquefeito (GNL) privado prometem continuar a movimentar o setor em 2024.

Para você não se perder nessa movimentação, a gas week preparou um raio-x atualizado dos fornecedores privados de gás do Brasil.

Quem vende para quem? Que comercializador tem mais contratos? Qual a concentração do mercado nas diferentes regiões do país? Como isso se traduz nos preços? A gente responde com alguns números…

A DIVERSIFICAÇÃO DO MERCADO EM DADOS
Levantamento da agência epbr, com base nos contratos públicos atualmente disponibilizados pela ANP, mostra que:

10 fornecedores privados possuem contratos com as distribuidoras estaduais de gás canalizado – que, enquanto o mercado livre ainda não desabrocha, seguem como principais destinos do gás de terceiros;
Esses contratos somam compromissos firmes de entrega de ao menos 10,5 milhões de m3/dia em 2024;
a Compass é a que possui maior volume contratado: 3,125 milhões de m3/dia; seguida da Galp (2,1 milhões de m3/dia) e Origem Energia (1,7 milhão de m3/dia);
a Galp é a fornecedora com portfólio de clientes mais diversificado: tem contratos ativos com nove concessionárias;
12 distribuidoras já têm contratos assinados com os supridores privados para compra de molécula no país;
a Bahiagás é a que possui o portfólio de supridores mais diversificado, com contratos ativos com oito supridores diferentes.
O levantamento inclui somente os contratos de gás firme – tanto os já ativos como aqueles com início de suprimento previsto para ao longo do ano, como é o caso da Compass, cujo contrato com a Comgás só começa a valer com a entrada em operação do Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP).

Não estão incluídos os volumes de gás vendido pelos agentes fora do universo das distribuidoras, seja no mercado livre, projetos de GNL small-scale ou no segmento termelétrico.

OLHANDO PARA A CONCENTRAÇÃO
Os supridores privados detêm uma fatia de 27,5% de todo o volume contratado pelas distribuidoras em 2024.

Embora os fornecedores comecem a direcionar cada vez o seu gás para o mercado do Centro-Sul, é no Nordeste que está a maior parte dos volumes alocados por essas empresas hoje.

O Nordeste é a única região onde, de fato, o mercado se desconcentrou:

71% do volume contratado pelas distribuidoras da região, em 2024, vem de fornecedores privados;

Para efeitos de comparação, esse market share é de:

19% no Sudeste
e 10% no Sul
Os dados da ANP sugerem que essa desconcentração se reflete nas condições de preços dos diferentes mercados.

De acordo com as informações mais atualizadas da agência reguladora, o preço do gás vendido às distribuidoras e consumidores livres era, em dezembro, 22,6% mais baixo no mercado Norte/Nordeste em relação ao Sudeste. Na comparação com o Sul/Centro-Oeste, era 23,3% mais barato.

Embora os fornecedores privados tenham avançado rapidamente sobre cerca de 1/4 do mercado das distribuidoras, nos últimos anos, esse movimento de desconcentração, no entanto, tende a desacelerar nos próximos anos se não forem adotadas novas medidas de redução do domínio da Petrobras.

Na agenda regulatória da ANP, a avaliação da proposta de gas release ficou para o fim da fila, com previsão de conclusão em 2025 (se não atrasar…)

E no Cade, a flexibilização do Termo de Compromisso de Cessação (TCC) assinado com a Petrobras em 2019, para abertura do mercado, está em rediscussão.

Enquanto o projeto Raia não entrar em operação e a importação de GNL não se mostrar uma alternativa mais competitiva, a principal fonte de gás novo no mercado deve ser mesmo o Rota 3 – que deve trazer gás do pré-sal predominantemente da Petrobras, sem mudanças radicais no funcionamento do mercado.

A propósito… nota técnica publicada pela ANP em 2023, com o diagnóstico da concentração do mercado de gás no Brasil, mostra que a fatia da Petrobras na produção de gás da Bacia de Santos deve cair de 70,1% em 2023 para 68,4% em 2026; na Bacia de Campos, por sua vez, deve subir de 81,1% para 84,8%.

QUEM É QUEM
Na comercialização de gás no Brasil, hoje, são dez os agentes privados com volumes firme contratados com as distribuidoras estaduais. O grupo inclui desde os grandes produtores de gás offshore aos operadores de campos terrestres e importadores. Vamos a eles:

3R Petroleum: Tem como principal fonte de gás o campo de Peroá, no offshore do Espírito Santo. A 3R vende gás para a ES Gás, Potigás e Bahiagás, todas concessionárias de estados onde a petroleira produz. A empresa tem compromissos de envio de 640 mil m3/dia em 2024 para essas três concessionárias, mas mira também o mercado livre. Aposta no gás não associado de Peroá como um atrativo na oferta de produtos flexíveis.

Alvopetro: Primeiro produtor privado a construir uma UPGN própria, a empresa monetizou seu gás num contrato de longo prazo com a Bahiagás que prevê o envio de 150 mil m3/dia firmes – sujeitos a ajustes.

Compass: Espera iniciar este ano as operações do TRSP. Tem contrato de suprimento com a Comgás, do mesmo grupo, com compromissos de 3,125 milhões de m3/dia por dez anos. Vê na importação de GNL uma oportunidade de desenvolvimento de seu braço de comercialização, a Edge, de olho no mercado livre e GNL em pequena escala.

Equinor: Tem contratos que somam 350 mil m3/dia firmes com a Bahiagás, Cegás e Gasmig. Esse gás se resume, basicamente, à produção de Roncador (Bacia de Campos). A Equinor vem testando o mercado com contratos de curto e médio prazos com as distribuidoras. A partir de 2028, a empresa deve se consolidar como uma das maiores fornecedoras privadas com o início da operação de Raia.

ERG: Primeiro produtor onshore a fechar um contrato de suprimento com a Bahiagás, em 2007. Ainda tem um saldo a entregar à distribuidora e assinou, recentemente, um aditivo contratual que prorroga até o fim do ano o prazo para recuperação dos volumes remanescentes, com envio de 40 mil m3/dia.

Galp: Presente em importantes campos produtores do pré-sal, como Tupi, a portuguesa é um dos agentes mais ativos no mercado. Costuma comprar gás de outros produtores, para revendê-lo. Tem, atualmente, contrato com nove distribuidoras, que somam 2,1 milhões de m3/dia em 2024: Bahiagás, Cegás, Copergás, ES Gás, Gasmig, SCGás, Sergas, Sulgás e PBGás. Concentrou a monetização de seu gás nas concessionárias estaduais, em sua maioria com contratos de longo prazo, mas também mira o mercado livre – aproximou-se, por exemplo, da ArcelorMittal.

New Fortress: A companhia espera iniciar no 1º trimestre as operações de seus dois novos terminais de GNL no Pará e Santa Catarina. A companhia tem contratos pequenos com a SCGás (em renegociação) e Copergás (herança da Golar Power), que somam 190 mil m3/dia. A estratégia de monetização da planta de Barcarena (PA) foi baseada, contudo, num complexo termelétrico e na Alunorte, no Pará. Em SC, a empresa ainda busca um grande contrato com termelétricas, indústrias no mercado livre e transportadores.

Origem: A produtora de gás onshore tem contratos, hoje, com a Algás e Bahiagás que somam compromissos firmes de 1,7 milhão de m3/dia em 2024 (incluindo a Eagle, sua controlada). Além da comercialização da molécula, em si, a empresa também quer desenvolver em Alagoas um serviço de estocagem subterrânea de gás.

PetroReconcavo: Tem contratos de suprimento com Bahiagás, Cegás, Copergás, Potigás e Sergas que, juntos, somam 1,4 milhão de m3/dia firmes em 2024. A empresa também aposta na oferta de contratos de curto prazo e interruptíveis no mercado e mira potenciais consumidores livres.

Shell: Também presente em Tupi, dentre outros campos do pré-sal, a multinacional monetizou parte de seus volumes na UTE Marlim Azul, parte com as distribuidoras e outra parcela no mercado livre. Aposta em contratos flexíveis. No mercado de distribuição, fornece 790 mil m3/dia firmes para Cegás, PBGás, Sergas e Comgás.

A lista de gente se movimentando no mercado, contudo, não para aí.

A Eneva, por exemplo, se prepara para iniciar este ano as operações de seu projeto de GNL em pequena escala que escoará a produção da Bacia do Parnaíba para a Suzano e Vale, no Maranhão. Também terá seu terminal de GNL de Sergipe conectado à malha de gasodutos este ano, o que abre oportunidades também de comercialização de gás importado.

A Tradener, tradicional comercializadora do setor elétrico, em conjunto com a GNLink, também espera começar a escoar a produção onshore de Barra Bonita, no Paraná.

E a MGás – joint venture entre a Mercurio e a MacawEnegies – está ativa na estruturação de um primeiro projeto de comercialização em Minas Gerais.

GÁS NA SEMANA
Futuro da TBG no Cade. O órgão antitruste deve aceitar o pedido da Petrobras e liberá-la do compromisso assumido em 2019 de vender os ativos de distribuição e transporte de gás. O Valor apurou que o Cade deve impor “remédios comportamentais” – restrições mais leves que a venda de ativos, como medidas de governança que garantam a atuação independente. O caso pode ser levado para deliberação do tribunal no fim de março.

Petrobras adia licitação de Sergipe. Estatal postergou por mais quatro meses o prazo de recebimento de propostas para afretamento das plataformas do projeto de Sergipe Águas Profundas. É o 3º adiamento da concorrência.

GNLink com novos projetos. Distribuidora de GNL small-scale prevê iniciar este ano as operações de suas duas primeiras plantas de liquefação (no PR e BA) e, em paralelo, espera confirmar mais dois novos projetos do tipo nos próximos meses. Também mira oportunidades de importar, no futuro, gás da Argentina.

Equinor e Galp têm novos clientes. Norueguesa assinou contrato de 5 anos com a Gasmig, enquanto a portuguesa fechou acordo com a PBGás.

PepsiCo vai de biometano. Companhia vai substituir combustíveis fósseis em suas fábricas e frota de caminhões pelo gás renovável a partir deste ano, num projeto para sua fábrica de salgadinhos em Itu (SP) desenvolvido pela Ultragaz.

Autor/Veículo: EPBR

Published On: 27 de fevereiro de 2024

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