A aprovação pelo Congresso da chamada Lei da Reciprocidade Econômica deu mais uma ferramenta de negociação para o Brasil se proteger do tarifaço aplicado pelo presidente Donald Trump, dos EUA, aos seus parceiros comerciais pelo mundo. Mas, para os especialistas, a diplomacia ainda seria o melhor caminho para o País se defender dos impactos econômicos desse ambiente de guerra comercial.

“A primeira movimentação brasileira vai ser abrir conversas com o governo americano. A nossa própria lei nova ( de reciprocidade) fala de abrir consultas antes de aplicar retaliação, e estamos tentando abrir conversas com as autoridades americanas”, diz o presidente do conselho curador da Fundação FHC, Celso Lafer, ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e das Relações Exteriores. “O argumento mais ou menos óbvio para o Brasil evitar as tarifas é de que os Estados Unidos têm superávit com agente .”

No domingo, integrantes do alto escalão do governo Trump disseram que mais de 50 países já haviam entrado em contato coma Casa Branca para negociaras tarifas deim portação. As taxas mais altas devem entrarem vigor hoje. O Brasil é um dos interessados.

“Creio que há uma margem de negociação para o Brasil. Não necessariamente vai acontecer amanhã, ou logo, ou que seja algo prioritário para os EUA”, diz o ex-secretário especial de assuntos estratégicos da Presidência da República (entre 2016 e 2018) e conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Hussein Kalout. “Entendo que ocorrerá em algum momento, ao largo dos próximos meses, em função da complementariedade doque o Brasil produz para a base industrial americana. O Brasil não ficará no final da fila do processo negociador. Haverá um diálogo positivo no contexto técnico”, prevê ( mais informações na pág. B5).

A percepção é a mesma do presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa, que foi embaixador do Brasil em Londres e em Washington. “Como ficou no nível mais baixo das tarifas variáveis, com 10%, o Brasil não tem alternativa, se não aguardar as reações ao redor do mundo, em especial do Canadá, do México, da União Europeia, da China e do Japão. A partir daí, apresentar queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) e avaliar, de forma pragmática e não ideológica,

“Trump quer tornar os EUA o centro de uma reorganização do comércio internacional. O poder do país é imenso, mas não é o único no mundo multipolar atual. Tem a União Europeia, a China e o Sudoeste da Ásia. Ele está supervalorizando a capacidade dos EUA”

Celso Lafer, ex-ministro de Relações Exteriores

como negociar com os EUA.”

PROPRIEDADE INTELECTUAL. O governo brasileiro já declarou formalmente que as medidas unilaterais são contrárias às regras da OMC, órgão que, no entanto, perdeu muito de sua força desde o primeiro governo de Donald Trump, que retirou o apoio dos EUA ao organismo multilateral.

Isso não significa que a OMC não deva ser acessada pelo Brasil, que pode tentar a aprovação no órgão do uso de retaliação cruzada, em propriedade intelectual contra os EUA. Lafer lembra que, durante contencioso sobre o algodão, nos anos 2000, esse mecanismo funcionou a favor do Brasil. Na ação, o País alegou que o programa americano de crédito e subsídios aos consumidores e exportadores de algodão teria sido responsável pela queda das cotações internacionais da commodity entre 1999 a 2002 – causando prejuízo à produção brasileira, o que motivou o questionamento ao órgão.

“A OMC autorizou contramedidas para o Brasil escolher em retaliação cruzada, e ele pegou em propriedade intelectual, onde dói mais para os EUA. Então, eles foram para a negociação”, lembra Lafer.

O problema, diz o ex-ministro, é que “ninguém está com coragem de dizer não ao ímpeto do Trump”. “Ele quer tornar os EUA o centro de uma reorganização do comércio internacional. O poder do país é imenso, mas não é o único no mundo multipolar atual. Tem a União Europeia, a China e o Sudoeste da Ásia. Trump está supervalorizando a capacidade dos EUA, que não são mais, como dizem os franceses, a ‘superpuissance’ ( hiperpotência) que eram nos anos 1990”, afirma Lafer.

LAÇOS COMERCIAIS. Outro caminho para o Brasil, segundo os especialistas, é estreitar laços comerciais com outras regiões, como forma de compensar o impacto da política tarifária de Trump. Há o acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia aguardando as aprovações finais dos países. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve no Japão em março, buscando abrir mercado a produtos brasileiros. E o governo também pode ampliar ou reativar negociações comerciais com países asiáticos, com o México e o Canadá.

O acordo comercial Mercosul-Canadá, que começou a ser negociado em 2018, por exemplo, pode retornar à pauta, assim como uma maior aproximação com o bloco das nações asiáticas (Asean).

Durante o anúncio da Novo Nordisk de investimentos em sua fábrica em Minas Gerais, na segunda-feira, a embaixadora da Dinamarca no Brasil, Eva Bisgaard Pedersen, afirmou que, “mais do que nunca, precisamos mostrar que a abertura e as parcerias internacionais são o caminho certo”. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
Published On: 9 de abril de 2025

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