Integrante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o conselheiro Gustavo Augusto repreendeu a Petrobras por ter rescindido o contrato de venda da refinaria Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor) sem uma análise anterior pelo órgão antitruste, com quem a petroleira tem um acordo vigente para desinvestimentos na área de refino desde 2019.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Gustavo Augusto reafirmou que o Cade já foi “muito claro” sobre estar disposto em reanalisar as bases do acordo – tecnicamente, um Termo de Compromisso de Cessação (TCC) – de forma técnica, mas alertou que a Petrobras não pode “de sua própria cabeça” passar a descumprir o TCC sem que o documento tenha sido revisto pelo tribunal.

A condução da estatal no caso pode, inclusive, ser alvo de punição pelo Cade – conclusão, contudo, que ainda depende da análise aprofundada pelo conselho.

Quando vimos a revogação da venda da Lubnor, é algo que nos preocupa. Nós também estamos olhando com apreensão as atitudes da Petrobras em relação ao TCC. Esse movimento vem também no meio de uma conduta da Petrobras, onde parece que a empresa buscou um antagonismo com o Cade”, disse Gustavo Augusto.

Na semana passada, a Petrobras fez um movimento duplo, ao comunicar a rescisão do contrato para a venda da Lubnor, localizada no Ceará, e acionar formalmente o Cade para tentar renegociar os TCCs de Refino e do Gás celebrados em 2019.

Embora o debate sobre a venda da Lubnor esteja no bojo da revisão do acordo de Refino, a Petrobras deveria ter provocado o Cade especificamente sobre o destino da unidade no Ceará, defendeu o conselheiro do órgão.

Em sua visão, embora não precisasse esperar uma devolutiva do conselho para anunciar que rescindiria a venda, o “prudente” seria aguardar uma manifestação do órgão antitruste antes de efetivar qualquer decisão, disse Gustavo Augusto.

“Me parece que o mais prudente seria: ela poderia ter anunciado, poderia não ter dado o andamento, mas ter sobrestado sua decisão até a resposta do Cade. Não haveria nenhum prejuízo, porque a venda foi rescindida no período de transição. Então a Petrobras poderia continuar operando a refinaria, comunicava a Lubnor, e levava o caso ao Cade e aguardava a posição do tribunal”, afirmou.

“Pode ser que ela venha a justificar essa revogação e nós vamos ter que analisar e decidir. Mas hoje, concretamente, ela revogou sem uma autorização do tribunal”, continuou.

Segundo ele, essa atitude da estatal pode gerar punição à empresa e aos seus executivos, a depender das conclusões que serão tomadas pelo Cade no curso das investigações. “Aí nós teremos que analisar o que aconteceu exatamente. Mas pode tanto pelo descumprimento do TCC como pode ter sido uma nova hipótese de abuso de posição dominante. E aí, nesse caso, sim, a depender do que for objeto da investigação, é possível a punição da empresa e dos seus executivos”, alertou Gustavo Augusto.

De acordo com o conselheiro, essa análise deverá ser feita na discussão do pedido de revisão do TCC, lembrando que o assunto ainda está na Superintendência-Geral do Cade e que, portanto, qualquer deliberação por parte do tribunal provavelmente só será feita em 2024.

Atualmente, o conselho está sem quórum para abrir sessões, com previsão de que os indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sejam sabatinados pelo Senado nesta terça-feira, 05. Com os nomes aprovados, a maioria do Cade será composta por escolhidos pela atual gestão petista.

Gustavo Augusto ainda argumentou que não há problema no fato de a nova direção da estatal não concordar com os acordos firmados no passado, mas reforçou que os TCCs estão assinados e que, para não segui-los, a Petrobras precisa convencer o Cade a revê-los ou buscar alguma salvaguarda no Judiciário.

“Ela pode ir para o Judiciário, tentar buscar uma liminar, tentar buscar uma reversão. O que não é legítimo é a empresa da sua própria cabeça passar a descumprir o acordo que ela mesmo celebrou”, asseverou o conselheiro, que reclamou ainda de declarações de que o Cade deveria ter comprovado a posição dominante da estatal. “Isso é um disparate. O Cade não tem que provar nada se a empresa assumiu um compromisso. Quando fez isso, ela reconheceu um problema anticompetitivo”, completou.

Gustavo Augusto também observou que os problemas envolvendo questões imobiliárias na venda da refinaria não eram novos e que a solução, inclusive, dependeria da União.

“Então, se você tem um imóvel da União na mão de uma empresa privada, você já está criando ali um privilégio a um ator privado, que deveria ser regularizado (…) Quando a União não regulariza essa situação e isso é utilizado com um (motivo para) a revogação, é algo que nos chama a atenção. Por que o que vai acontecer agora? Esse imóvel vai voltar para a União e a refinaria vai ser fechada? Ou o imóvel vai continuar lá e vai continuar na mão de uma de uma empresa privada, sem uma regularização do aspecto fundiário, e apenas como um aspecto que seria, digamos assim, uma desculpa para o descumprimento do TCC?”, questionou o integrante do Cade.

Autor/Veículo: O Estado de São Paulo

Published On: 5 de dezembro de 2023

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