Nos últimos anos, a pauta ambiental está cada vez mais presente no mercado financeiro, com empresas optando por definir e seguir objetivos a favor de políticas sustentáveis de combate à crise climática. Seguindo essa toada, a Petrobras anunciou, na última terça-feira (19/9), a primeira gasolina carbono neutro do Brasil. Mas o que exatamente isso significa para a economia do país?

Especialista consultado pelo Metrópoles afirma que a iniciativa pode ser vantajosa para o mercado de combustíveis nacional ao aumentar a competitividade entre as refinadoras e estimular a criação de políticas públicas ambientais “confiáveis” e “seguras”.

Para o professor de economia do meio ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Ronaldo Seroa da Motta é “impossível” que as empresas não participem dessa trajetória ambiental: “O capital tornou-se sustentável”.

“Mesmo com um desafio grande, ela [Petrobras] vai criar uma competição com outras produtoras de combustíveis nacionais. A gente espera e também fica interessado em criar um mercado focado na economia sustentável”, disse. Motta também elogia a iniciativa da empresa em “começar a reconhecer que os combustíveis fósseis precisam ter uma ‘pegada’ neutra de carbono”.

Efeito estufa compensado

Por meio da metodologia de avaliação do ciclo de vida (ACV), que mensura os gases de efeito estufa emitidos pelo produto, a Petrobras conseguiu agregar o título de “carbono neutro” — compensação das emissões de CO² com ações de preservação ou de recuperação florestal de biomas nacionais — ao combustível após avaliação de especialistas da consultoria ACV Brasil.

Segundo a empresa, a Gasolina Petrobras Podium carbono neutro terá a emissão de gases de efeito estufa “totalmente” compensada em todas as etapas do ciclo de vida do combustível. Ou seja, desde a extração e produção das matérias-primas, transporte, distribuição até o uso final.

Mas os consumidores não vão encontrar a gasolina carbono neutro em qualquer posto da Petrobras. O combustível estará disponível apenas em locais selecionados pela empresa nas principais cidades do país, que não foram divulgadas.

No entanto, ainda é uma incógnita como, quando e quais serão as ações da empresa para compensar as emissões. Apenas no ano passado, 47,7 milhões de toneladas de dióxido de carbono foram emitidos na atmosfera pela Petrobras, sendo 44,3 milhões provenientes da exploração e produção de petróleo e gás natural, incluindo o refino e o transporte marítimo.

Armadilha do clima

De acordo com projeção da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do Ministério de Minas e Energia (MME), em 2029 a produção de petróleo no Brasil pode chegar a um pico, com a estimativa de 5,4 milhões de barris por dia (m/boed).

Tal marca é preocupante, principalmente levando em conta os compromissos oficiais do Brasil presentes no Acordo de Paris, que tem metas definidas até 2030. Com atualização anunciada pela ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, na Organização das Nações Unidas (ONU), a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, sigla em inglês) brasileira compromete-se a reduzir as emissões em 48% até 2025 e em 53% até 2030. A promessa anterior era cortá-las em 37% e 50%, respectivamente.

Motta critica que “não estamos vendo ainda uma mudança muito radical” para sairmos “dessa armadilha do clima”. “A gente tem que reduzir de 40% a 50% das emissões até 2030, e 90% a 95% até 2050. Então é um desafio muito grande”, explicou.

Políticas públicas = incentivo permanente

Eventos extremos e mudanças constantes de temperatura estão cada vez mais frequentes no planeta. Um relatório, publicado este ano pela ONU, indica que “a ambição de mitigação das contribuições nacionalmente determinadas não é coletivamente suficiente para alcançar a meta de temperatura do Acordo de Paris”.

Motta destaca que, só com políticas públicas, como de transição energética, criação de impostos e de um mercado obrigatório de carbono, as empresas terão um “incentivo permanente” para cumprir esses objetivos ambientais seguindo uma direção “mais confiável e segura”.

“É importante [implementação de políticas públicas] porque esse espírito voluntário é muito sensível a mudanças. Ele acredita que a entrada desse segmento do mercado até a sustentabilidade é necessária, mas ele reforça que tais ações precisam estar em “consenso com a sociedade”.

“Claro, isso significa que alguns setores vão perder tamanho e outros vão crescer”, afirmou Motta. Mas, ainda conforme o professor, essa mudança direcionada ao foco ambiental e climático “vai gerar ganhos, sem nenhuma dúvida”.

“Há agora uma percepção na gestão das empresas e stakeholders de que isso é importante. Além disso, é uma preocupação da sociedade civil. No mundo, entidades de alguns países já têm ações contra empresas que não colaboram no combate do aquecimento global”, explicou.

Segundo Motta, devido à valorização do mercado financeiro em governança ambiental, social e corporativa (ESG, sigla em inglês) há cobranças de acionistas e consumidores para a adoção de objetivos para mitigar e compensar as emissões de gases estufa na atmosfera.

Contudo, tal tarefa não é “simples” de ser implementada. Há diversas dificuldades, entre elas:

maneiras claras para atingir as metas definidas;
ter um projeto ambiental seguro e confiável;
criar projeto de crédito de carbono;
auferir os ganhos reais desse comportamento compensatório; e
transparência das ações por meio de um quadro/relatório para acompanhamento da progressão das metas.
Autor/Veículo: Metrópoles

Published On: 25 de setembro de 2023

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