09/06/2022

Fonte: CNN

A combinação do projeto de lei que estabelece um teto de 17% na cobrança do ICMS nos combustíveis com a PEC sobre a isenção de impostos federais e estaduais para esses produtos geraria, isoladamente, uma queda de mais de 2 pontos percentuais na inflação em 2022, segundo estimativas de economistas consultados pelo CNN Brasil Business.

Porém, isso não significa que esse será o cenário, na prática, explicam os especialistas. Mesmo que ambos os projetos sejam aprovados sem alterações, o risco fiscal que eles representam, em especial a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), deve fazer com que o dólar valorize.

Além disso, a gasolina e o diesel seguem defasados, o que deve exigir novos reajustes pela Petrobras. Juntos, esses dois elementos reduziriam o potencial de queda nos preços.

Indo para além de 2022, os economistas ressaltam que as isenções temporárias de impostos acabariam tendo o efeito oposto, inflacionário, em 2023, tornando o quadro econômico mais complicado.

Grau da redução

Flávio Serrano, head de análise macroeconômica da Greenbay Investimentos, estima que o PLP 18, que estabelece o teto de 17% na cobrança de ICMS para combustíveis, energia, telecomunicações e transporte, teria o maior efeito deflacionário, já que a maioria dos estados cobra alíquotas acima do teto proposto.

A expectativa atual dele, baseada no projeto aprovado na Câmara, é que a redução seja de 1,5 ponto percentual na inflação no final de 2022, estimada hoje pelo mercado em 8,9%.

Dependendo de alterações no projeto e onde as cobranças incidirão, a queda poderia ser de 1,8 ponto percentual.

“É uma queda expressiva, e o impacto é permanente, pega esse ano e, como não há expectativa de reversão, não impacta 2023. Só teria uma certa inércia, da inflação mais baixa nesse ano ajudando no seguinte”, diz.

Há, ainda, a chamada PEC dos Combustíveis, que envolveria a isenção de ICMS no diesel e gás e do PIS/Cofins e Cide, tributos federais, na gasolina.

Em relação ao projeto, Serrano estima um efeito deflacionário de 0,25 ponto percentual no caso do diesel e gás e de 0,75% p.p. envolvendo a gasolina. Com isso, a deflação total varia de 2,5 ponto percentual a 2,8.

É uma estimativa semelhante à do economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez. Ele projeta um impacto máximo de 2,5 p.p. na inflação apenas com os impostos zerados, mas, ao contabilizar um repasse de 80% dessa queda aos consumidores, o recuo seria de 2,15 p.p.

Já em relação ao projeto do teto do ICMS, individualmente ele representaria uma queda de 0,9 p.p., com 0,75 repassado ao consumidor.

https://flo.uri.sh/visualisation/10280483/embed

Em ambos os casos, não foi considerado o impacto indireto na redução dos preços dos combustíveis, que tende a ser alto considerando a dependência do transporte rodoviário no país.

Outra projeção, do banco Bradesco, estima que a inflação deste ano ficaria em 6,8%, e não mais em 9%, com os projetos. Já a de 2023 subiria para 5,1%, ante os 4,1% inicialmente previstos.

Entretanto, Mauro Rochlin, professor da FGV Rio, destaca que esses projetos teriam efeitos primários, mas não seriam os únicos elementos que influenciariam na inflação. “Não adianta olhar só a pedra do mosaico, tem que ver ele todo”. E, ao considerar outros elementos, os benefícios com os projetos tendem a ficar menores.

 Consequências negativas

Sanchez afirma que as próprias estimativas atuais podem mudar dependendo das alterações que os projetos sofram enquanto tramitam no Congresso, que poderiam reduzir ou aumentar o potencial de alívio inflacionário.

Porém, o principal problema, na visão de Rochlin, é que os preços dos combustíveis não dependem apenas dos impostos, e o peso maior costuma ser da cotação internacional do petróleo e do quão valorizado o dólar está em relação ao real.

“Os preços nesse momento não estão alinhados com os internacionais, e se a Petrobras seguir com a paridade, já deveria ter feito novo reajuste, e poderia compensar esses cortes”, avalia.

O economista da Ativa afirma que é improvável que os reajustes neste ano compensem toda a queda de preços na gasolina e no diesel, mas que é possível que uma parte seja revertida.

Já Serrano estima que um novo reajuste de 15% na gasolina, para compensar a defasagem internacional, representaria 0,6 ponto percentual a mais na inflação. “Um reajuste já levaria à perda de um desses efeitos, provavelmente o da PEC. Mas é algo incerto. Os preços podem passar a cair”.

https://flo.uri.sh/visualisation/10266728/embed

Outra questão surgiu após o anúncio da PEC que criaria um fundo de compensação aos estados e permitira a isenção do ICMS. A estimativa atual do governo federal é que o projeto representaria um impacto de R$ 25 bilhões, enquanto a isenção de impostos federais levaria a uma perda de receita de R$ 15 bilhões, em um cenário orçamentário já apertado.

Segundo Serrano, o mercado “adicionou um prêmio de risco” ao prever uma piora do quadro fiscal com o projeto, e até ameaças ao teto de gastos. Com isso, o dólar passou a subir, e já chegou à casa dos R$ 4,90.

“A alta do dólar poderia mitigar parte dos efeitos deflacionários, é o risco ao piorar o fiscal e o câmbio depreciar”, diz.

Mesmo com esse cenário, e a expectativa de uma eleição que gerará volatilidade e depreciação ao câmbio, o economista ainda espera “um câmbio comportado, pelos juros altos e balança de pagamentos boa”.

Rochlin, da FGV, avalia que “a própria medida de redução de impostos representa um impacto importante nas contas do governo, dificulta um bom desempenho, e isso tem reflexos no câmbio, como estamos vendo, e na taxa de juros, porque com inflação maior a gente tem uma taxa maior”.

O mercado não vê isso com bons olhos porque tem impacto nas contas, e o que o mercado interpreta é um pior desempenho, o que aumenta o que chamamos de aversão ao risco dos investidores, e se traduz em dólar mais caro, que empurra preços para cima e gera mais inflação

Mauro Rochlin, professor da FGV Rio

Étore Sanchez considera ser cedo ainda para mensurar o efeito dos projetos no dólar, e a consequência para a inflação.

“Se esse movimento de alta se confirmar, já que só parte do risco fiscal foi considerado porque não foram aprovados, pode ter um efeito inflacionário. Ainda assim, é um cálculo poluído, porque parte do pressuposto que os outros fatores ficarão constantes, o que é muito raro”, diz.

Efeito em 2023

Outra consequência negativa da nova PEC proposta pelo governo é que ela deve ter um efeito inflacionário em 2023.

Serrano afirma que os efeitos do PLP 18, que estabelece o teto para o ICMS, seriam positivos, pela inércia inflacionária menor, mas os da PEC não. “Esses impostos zerados voltariam no ano que vem, então, é uma situação em que você ganha agora, mas perde depois”.

A Ativa projeta que o efeito inflacionário da PEC representaria entre 2,2 pontos percentuais e 2,6 pontos percentuais a mais na inflação de 2023, ou seja, praticamente o mesmo valor da redução neste ano.

O quadro envolveria uma piora do problema fiscal, juros maiores e um Produto Interno Bruto (PIB) menor, o que resulta em um “saldo líquido negativo desse projeto para a sociedade”, segundo Sanchez.

Rochlin considera que a retomada dos impostos no ano seguinte geraria um efeito inflacionário, em especial se a cotação do dólar e os preços do petróleo se mantiverem altos até o fim deste ano.

“Voltando a cobrar impostos, reflete nos preços e impacta a inflação do ano que vem, sem considerar um cenário pior de petróleo mais caro e dólar subindo, comum em período de eleições”, aponta.

Ele afirma que o PLP pode ter efeito isoladamente deflacionário por ser definitivo, em especial nos outros setores que engloba. A PEC, porém, deve ser mais prejudicial, em um quadro que ele resume como “aliviar a inflação deste ano piorando a de 2023”.

Published On: 10 de junho de 2022

Últimas Noticias

Compartilhe este conteúdo!